9.10.2008

Despedimo-nos numa das esquinas do Onze.
Da outra calçada tornei a olhar: você se tinha virado e dava-me adeus com a mão.
Um rio de veículos e de gente corria entre nós; eram as cinco de uma tarde qualquer; como iria eu saber que aquele rio era o triste Aqueronte, o insuperável.
Não nos vimos mais, e um ano depois você tinha morrido.
E eu, agora, busco essa recordação, e olho-a e penso que era falsa, e que por trás da despedida trivial estava a infinita separação. Na noite passada não saí depois do jantar e reli, para compreender estas coisas, o último ensinamento que Platão põe na boca do seu mestre. Li que a alma pode fugir quando morre a carne.
E agora não sei se a verdade está na aziaga interpretação ulterior ou na despedida inocente.
Porque se as almas não morrem, é perfeitamente justo que em suas despedidas não haja ênfase.
Dizer-se adeus é negar a separação, é dizer: Hoje brincamos de nos separar, mas amanhã nos veremos.
Os homens inventaram o adeus porque se sabem de algum modo imortais, ainda que se julguem contingentes e efêmeros.
Delia: um dia continuaremos – junto de que rio? – este diálogo incerto e nos perguntaremos se alguma vez, numa cidade que se perdia numa planície, fomos Borges e Delia

Jorge Luis Borges

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