3.18.2008

Aos setenta anos de idade, exatamente no ano de 1970, Jorge Luís Borges, escreve O Informe de Brodie, livro de contos, que foge de seu estilo antigo, repleto de abstratos e signos. No prólogo o escritor afirma que a “literatura não é outra coisa que um sonho dirigido” e “tentei, não sei com que resultados, a redação de contos diretos. Não me atrevo a afirmar que são simples; não há na terra uma só página, uma só palavra, que o seja, já que todas postulam o universo, cujo atributo mais notório é a complexidade.” As citações vêm de encontro com o esforço do escritor na busca da simplicidade e quase que por milagre, encontramos aqui um Borges claro, rasteiro à realidade e extremamente simples, sem a complexidade dos seus escritos anteriores, onde sonhos emaranhados eram os ditadores da literatura. Dos onze contos do Informe de Brodie, somente dois deles possuem a chave fantástica. Borges preferiu nesses contos, segundo suas próprias palavras, a preparação de uma expectativa à de um assombro. Aos setenta anos Jorge Luis Borges diz ter encontrado a “sua voz”.
No Informe de Brodie, os contos estão situados longe, no tempo e no espaço, permitindo à imaginação agir com mais liberdade. Borges escreve esses contos de maneira fiel como lhe foram narrados, ou vividos, mas diz sofrer as tentações literárias de acentuar ou acrescentar aqui ou acolá, algum detalhe. O tema principal das narrativas de Borges é a religião da coragem e em todos eles, há casos de brigas, punhais, assassinatos e traição, sempre entre dois rivais e coincidentemente, sempre parecidos, como se o autor se dividisse em dois ou ainda como se olhasse um espelho. Há em Borges o dom da ambigüidade intencional.
Especial atenção merece o conto: “O encontro”, que relata um duelo entre dois homens, numa casa cujo dono era colecionador de armas brancas. O contista encerra a narrativa concluindo que não foram os homens que duelaram. “Lutaram as armas e não os homens. Elas tinham dormido lado a lado numa vitrina até que as mãos as despertaram” e “Em seu ferro dormia e espreitava um rancor humano”.
Dos onze contos publicados em O Informe de Brodie, encontramos em “ O Evangelho Segundo São Mateus” a riqueza da narrativa e o final surpreendente, qualidades que caracterizam grandes escritores. Os contos de Borges, construídos em diversos planos, encerram riquezas não apenas visíveis nas palavras, no mundo real, mas também no mundo virtual com a disposição e ligação dos elementos narrativos. Cada leitura encanta e a aventura de depararmos com um Borges claro e acessível, resulta compensadora.

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