7.31.2009

Acostumara-se a rios e limos,
galhos secos e árvores frondosas.
E de tanto viver entre
peixes e pássaros,
um dia seu corpo se fendeu
e apareceram-lhe,
não sei se penas,
não sei se escamas.

Só sei que um caboclo
em passeio pela mata,
jurou ter visto
numa noite de luar
o voo de um peixe alado.
Ou seria um pássaro
intentando o nado?

7.28.2009

ruínas

7.25.2009

houve (há) um enorme silêncio
anterior ao nascimento das estrelas
antes da luz
a matéria da matéria
de onde tudo vem incessante
e onde tudo se apaga
eternamente
esse silêncio grita sob nossa vida
e de ponta a ponta a atravessa
estridente

Ferreira Gullar

7.24.2009

Vou buscar num altar qualquer
da minha infância,
o encanto mágico da lamparina,
onde a chama estática
flutuava sobre água e óleo.
Trago essa luz-menina
para os dias adultos
que a vida

se encarregou de escurecer...

7.15.2009

o veludo da pétala despregada
o musgo
o toque
e o sussurro...
ah!
quanta suavidade desperdiçada.

7.14.2009

A cor da borra
que o cristal transpassa
é como a marca
incólume deixada
por este amor
com textura de taça,
que como o vinho,
se acabou...

7.13.2009

Se morro
universo se apaga como se apagam
as coisas deste quarto
se apago a lâmpada:
os sapatos - da - ásia, as camisas
e guerras na cadeira, o paletó
- dos - andes,
bilhões de quatrilhões de seres e de sóis
morrem comigo.
Ou não:


o sol voltará a marcar
este mesmo ponto do assoalho
onde esteve meu pé;
deste quarto
ouvirás o barulho dos ônibus na rua;
uma nova cidade
surgirá de dentro desta
como a árvore da árvore.

Só que ninguém poderá ler no esgarçar destas nuvens
a mesma história que eu leio, comovido.

Ferreira Gullar

7.06.2009

Não me alimentes com migalhas da tua mesa, nem me presenteies com mimos de má qualidade. Sou mulher de pérolas e poemas. Trago na pele a verve dos bravos e os suores de seis orgasmos. Ardo em brasas, mas, possuo também a frieza daqueles que sabem a hora de sepultar sentimentos. Abandono é mote de poesia e por isso me atrai tanto depois de repugnar. Choro pouco sobre os que morreram. Afinal, apesar do silêncio do funeral, haverá sempre pêndulos que oscilam e sinos a dobrar.

7.03.2009

É lentíssimo o abandono
deste amor alforriado,
que vai deixando na retirada,
marcas tangíveis do tempo
em que foi senhor e escravo
do meu pensamento
e da minha aflição.

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