12.31.2007

FELIZ ANO NOVO

12.28.2007


Não te apresses, dia iluminado.
Caminha devagar
em direção ao ocaso.
Entretém o pássaro que longe voeja
e abranda o suor do homem
que na roça ainda peleja.

Oh dia,
vela o sono do tempo
para que se retarde
e faze das horas
uma cantiga vagarosa
até seu entardecer.

Não te apresses,
ó dia de beleza tanta.
Joga lentas tuas sombras
sobre os muros
Permanece, se puderes!
Tenho medo do escuro
que se alevanta.
Rasgou-se o lençol da bruma.
Um arrepio de luz
abriu as flores molhadas
e transformou-as em espuma.

E um grito feito de sangue
toldou a manhã inteira.
Atiro às asas do vento
minha amargura ligeira.

Albano Martins

12.26.2007


12.22.2007

Eles caminharam longos dias sob sol ardente
e céu premente de espera da estrela-guia.

Ela, virgem de Nazaré, prometida em casamento
ao bom e silencioso José,
levava ainda na alma, o desnorte e o conforto
das palavras de Gabriel.

Carregava entranhado no corpo de menina
a sombra do espírito,
submissão de escrava, obediência sibilina.

Por haver faltado em Belém hospedaria,
num estábulo, encapelado de poesia,
Ela deu à luz o menino,
que recebeu por berço, a manjedoura,
o calor dos rebanhos,
a acolhida dos pastores assustados,
em louvores dizendo:
“Glória a Deus nas alturas, e paz na terra
aos homens do Seu agrado”.

Na noite móbil daquele nascimento,
onde se agitavam anjos, pastores e rebanhos,
brisa leve e estrela cadente,
envolto em panos e encantamento,
deitava-se o Rei.

Num instante de contemplação,
meditemos nessa história repleta de paz,
e como Maria pertinaz e santa,
juntemos todas essas coisas,
ponderando-as humildemente no coração.



Feliz Natal!

12.20.2007



Em cada vão da veneziana,
uma nesga de sol
abre no quarto
o sulco do dia.

A noite se despede
e deixa na pele
o ranço de quem
se sabe só...

12.16.2007

Interrogo-me sobre esta
melancolia do entardecer,
como se já estivesse assente
que todo princípio de noite
é de dor de parto e choro de nascente.

Interrogo-me sobre este céu enfermiço
que se tinge de rosa de fim de ocaso
e do cinza da treva que se aproxima,
cor indecisa, sem nome e sem poesia.

Interrogo-me por fim, sobre a languidez
de punhal em riste destes acordes tristes
com que Gounod compôs a Ave Maria
e que cravam em minha alma de dúvidas
o gume de tristeza e da nostalgia.
Se é fato que
toda a massa do sistema
solar (somando a de Saturno e Marte
e Terra e Vênus e Urano e Mercúrio
e Plutão, mais
os satélites, mais
os asteróides, mais) equivale
apenas a 2% da massa
total do Sol e
que o Sol não é mais
que um mínimo ponto
de luz na estonteante tessitura de
gás e poeira da Via Láctea
e que a ViaLáctea é apenas uma
Entre bilhões de galáxias
que à velocidade de 300 mil km por segundo
voam e explodem
na noite
então pergunto:
o que faz aí
meu poema com seu
inaudível ruído?

Ferreira Gullar

12.10.2007


Argênteo entardecer...

12.08.2007

Ao contrário dos outros homens
em que as almas habitam o corpo,
nele era diferente.

Seu espírito era senhorio da carne.
E quem ficasse atento
à sua passagem,
poderia sentir o flanar de asas
em lugar de gestos;
compassos de música
em lugar de passos,
versos locando palavras.
Lembra-te:
ainda há pouco
havia à beira
do caminho
algumas pétalas.
Agora
há lama e nela
afundas os sapatos.
E outro caminho não conheces.
E outro também não há.

Albano Martins

12.03.2007


Saio da cela que me impus
e vou para fora,
onde a erva brota fresca da raiz,
como o rio do veio fino
na terra umedecida.

Lá fora, onde os lábios
da rosa entreaberta
bafejam para mim
seu hálito de primavera.
Onde esvoaçam loucos
os pardais e seus filhos
em volta dos choupos.

Vou ao encontro
das alegres abelhas
e deixo sobre minha mesa
a vela da dor que arde acesa.
Ela há de alumiar
o que restou do cárcere
onde a certeza se edificou.

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