1.29.2008

Arpejos de Gounod
crescem nas veias.
O sopro do vento
acende luzes
nos postes da vila.
Anjos em cortejo
dobram os joelhos
em nuvens de espuma.
Os olhos do dia
pestanejam em abandono.

1.24.2008



Réstia de luz sobre minha aldeia.

1.20.2008

Olho que o horizonte é longe,
E meu olho procura sombras.
A mim mesmo encontra
Na retina em que se esconde

Vagas promessas sigo:
Fazem perder o caminho.
Horizonte é longe, logo ali
—E segue se indo.

Passo por mim tempo todo
Volto. Por mais que vá
Encontro a mim voltando.

Um dia quem sabe se virá
Velho, voltarei a mim
Sem precisar ter que chegar.

W.L.Teodoro

1.18.2008


É preciso dar-lhe abrigo
antes que seus pés
tomem a forma do asfalto;
antes que o desrumo
o leve a pensar que é Deus.

É preciso dar-lhe asilo
antes que seus braços se tornem asas,
antes que ele se faça de pássaro.

É preciso apagar seu vício,
legar doses de fé e alquimia,
dar brilho à sua vida sem viço
antes que a poesia se acabe,
antes que ele escureça,
antes que tudo se torne quase.

1.14.2008

Moram dentro de mim
duas lobas famintas
de apetites distintos.
A fera se alimenta
do ódio, da hipocrisia
e das verdades que omito.
A outra é mansa.
Sonha e sorve a poesia
que lhe dou aos goles.

Á besta
basta o vento
soprado dos foles
para acender sua ira.
Já a mansa
tem a inapetência
dos poetas em transe
e a sede da criança
que brinca distraída.

Iludo-as até que se cansem.
E encho suas talhas
de metáforas e mentiras.

1.05.2008


O prazer do difícil tem secado
a seiva em minhas veias.
A alegria espontânea se foi.
O fogo esfria no coração.
Algo mantém cerceado
meu potro,
como se o divino passo
já não lembrasse o Olimpo,
a asa, o espaço,
sob o chicote, trêmulo, prostrado,
e carregasse pedras.

Diabos levem
as peças de teatro que se escrevem
com cinqüenta montagens e cenários,
o mundo de patifes e de otários,
e a guerra cotidiana com seu gado,
afazer de teatro, afã de gente,
juro que antes que a aurora se apresente
eu descubro a cancela e abro o cadeado.


William B. Yeats

1.02.2008

Há pedaços de asas
desfolhadas de mariposas descuidadas,
espalhadas pelo chão do quarto.
Num canto à minha frente,
teias de aranha se apagam
com a proximidade do dia.
Lá fora,
há o silêncio dos galos
que já não cantam
anunciando a manhã.

Insiste em mim o resto da noite
de suor e pesadelo.
O lume do sol atravessa-me
como adaga de dois gumes.

Dos lençóis amarrotados
levanta uma atriz enfurecida
que vai representar todos os papéis
com o fingimento gutural das palavras,
onde não existe alegria.

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