Subamos!Subamos acimaSubamos além, subamosAcima do além, subamos!Com a posse física dos braçosInelutavelmente galgaremosO grande mar de estrelasAtravés de milênios de luz.Subamos!Como dois atletasO rosto petrificadoNo pálido sorriso do esforçoSubamos acimaCom a posse física dos braçosE os músculos desmesuradosNa calma convulsa da ascensão.Oh, acimaMais longe que tudoAlém, mais longe que acima do além!Como dois acrobatasSubamos, lentíssimosLá onde o infinitoDe tão infinitoNem mais nome temSubamos!TensosPela corda luminosaQue pende invisívelE cujos nós são astrosQueimando nas mãosSubamos à tonaDo grande mar de estrelasOnde dorme a noiteSubamos!Tu e eu, herméticosAs nádegas durasA carótida nodosaNa fibra do pescoçoOs pés agudos em ponta.Como no espasmo.E quandoLá, acimaAlém, mais longe que acima do alémAdiante do véu de BetelgeuseDepois do país de AltairSobre o cérebro de DeusNum último impulsoLibertados do espíritoDespojados da carneNós nos possuiremos.E morreremosMorreremos alto, imensamenteIMENSAMENTE ALTO.
Vinícius de Moraes
Segunda De poetas e filósofos tu sabes, sabes também por ti. Por isso eu digo : esta pedra é vermelha, esta pedra é sangue. Toca-lhe : saberás como em segredo florescem as acácias ao redor dos muros, como fluem suas concêntricas artérias. Acaricia-as : tocas a parte mais sensível de ti mesmo. Dizias ontem que o verão ardia nesta pedra. Nela queimavas tuas mãos. Onde as aqueces hoje? Eu digo : o verão não morreu,esta pedra é o verão. E tudo permanece. E tudo é teu. Tu és o sangue, o verão e a pedra. Albano Martins
Amor amado, que no vão da caixa
Te resguardas.
Como é belo completar-te assim,
Tão cheio de poeira e esquecimento.
Resguardado em linhas de cartas,
És configurado de confissões e de palavras antigas.
Frutos afoitos que já estão quietos,
Apodrecendo de tanta maturidade!
Já não possuis a ansiedade de tua mocidade.
O que tens é esta atmosfera de segredo
Que se revela aos poucos.
Cada palavra que se levanta
Deste papel empoeirado
É um osso que se junta aos poucos
Para recompor o corpo que já se foi do tempo.
O amor não morre,
Vira palavra. Fábio de Melo
Além do mundo, onde choram os inconformados... Além da desesperança, um casulo... Um casulo de intrincada trama, tecido pela taturana, por proteção ou esconderijo. Em tempo ninfal, a crisálida aguarda no estado de larva. Logo virá a borboleta de matizes diurnos a confundir-se com as flores do quintal. Além do mundo, onde aderna e miséria, além da comédia ou da dor extrema, um poema... Um poema de invólucro filamentoso onde eu crisálida, me alijo (lagarta intemporal), por tessitura ou bravata. Logo virá a poesia nascida do estado letárgico. Ninfa noturna de hábito matinal.