10.09.2006




Subamos!
Subamos acima
Subamos além, subamos
Acima do além, subamos!
Com a posse física dos braços
Inelutavelmente galgaremos
O grande mar de estrelas
Através de milênios de luz.

Subamos!Como dois atletas
O rosto petrificado
No pálido sorriso do esforço
Subamos acima
Com a posse física dos braços
E os músculos desmesurados
Na calma convulsa da ascensão.

Oh, acima
Mais longe que tudo
Além, mais longe que acima do além!
Como dois acrobatas
Subamos, lentíssimos
Lá onde o infinito
De tão infinito
Nem mais nome tem
Subamos!

Tensos
Pela corda luminosa
Que pende invisível
E cujos nós são astros
Queimando nas mãos
Subamos à tona
Do grande mar de estrelas
Onde dorme a noite
Subamos!

Tu e eu, herméticos
As nádegas duras
A carótida nodosa
Na fibra do pescoço
Os pés agudos em ponta.

Como no espasmo.

E quando
Lá, acima
Além, mais longe que acima do além
Adiante do véu de Betelgeuse
Depois do país de Altair
Sobre o cérebro de Deus

Num último impulso
Libertados do espírito
Despojados da carne
Nós nos possuiremos.

E morreremos
Morreremos alto, imensamente
IMENSAMENTE ALTO.

Vinícius de Moraes

10.06.2006


Segunda
De poetas e filósofos tu sabes,
sabes também por ti.
Por isso eu digo : esta pedra é vermelha,
esta pedra é sangue.
Toca-lhe :
saberás como em segredo
florescem as acácias ao redor dos muros,
como fluem suas concêntricas artérias.
Acaricia-as :
tocas a parte mais sensível de ti mesmo.
Dizias ontem que o verão ardia nesta pedra.
Nela queimavas tuas mãos.
Onde as aqueces hoje?
Eu digo : o verão não morreu,
esta pedra é o verão.
E tudo permanece.
E tudo é teu.
Tu és o sangue, o verão e a pedra.

Albano Martins

10.05.2006

Amor amado, que no vão da caixa
Te resguardas.
Como é belo completar-te assim,
Tão cheio de poeira e esquecimento.
Resguardado em linhas de cartas,
És configurado de confissões e de palavras antigas.
Frutos afoitos que já estão quietos,
Apodrecendo de tanta maturidade!
Já não possuis a ansiedade de tua mocidade.
O que tens é esta atmosfera de segredo
Que se revela aos poucos.
Cada palavra que se levanta
Deste papel empoeirado
É um osso que se junta aos poucos
Para recompor o corpo que já se foi do tempo.
O amor não morre,
Vira palavra.


Fábio de Melo

10.04.2006






Além do mundo, onde choram os inconformados... Além da desesperança, um casulo... Um casulo de intrincada trama, tecido pela taturana, por proteção ou esconderijo. Em tempo ninfal, a crisálida aguarda no estado de larva. Logo virá a borboleta de matizes diurnos a confundir-se com as flores do quintal. Além do mundo, onde aderna e miséria, além da comédia ou da dor extrema, um poema... Um poema de invólucro filamentoso onde eu crisálida, me alijo (lagarta intemporal), por tessitura ou bravata. Logo virá a poesia nascida do estado letárgico. Ninfa noturna de hábito matinal.

Powered by Blogger